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Justiça anula júri dePMs e taxista que mataram estudante de 18 anos

Crime aconteceu em 1996. Augusto César Soares Dourado foi confundido com assaltante


MARCELO BRANDÃO

Quatorze anos depois do assassinato do estudante Augusto César Soares Dourado, completados anteontem, os cinco acusados pelo crime continuam impunes. Os quatro policiais militares e o taxista condenados pelo homicídio conseguiram obter a anulação do julgamento por causa deumerro ocorrido no Tribunal do Júri.

O estudante, na época com 18 anos, foi executado sumariamente ao ser confundido com um assaltante, depois de uma colisão de trânsito banal, em 1996. O julgamento do caso Guto, como ficou conhecido, foi anulado em julho do ano passado.

Augusto César foimortono dia 15 de junho de 1996, depois de colidir o seu carro contra o táxi pertencente a Florisvaldo, no bairro de Brotas.

O estudante e um amigo que estava no banco do carona fugiram do local após o abalroamento e passaram a ser perseguidos pelo taxista e outros colegas de profissão, que foram avisados por rádio.

Avisados por taxistas, policiais militares também passaram a perseguir Guto e o amigo, achando que se tratara deumassaltante. Depois de uma verdadeira caçada humana, o desfecho trágico no Jardim de Alah. Augusto César parou o carro ao avistar uma viatura da PM, achand0 que estaria a salvo, mas foi executado com vários tiros.

Completados exatos 14 anos do assassinato de Augusto César, na última terçafeira, o ex-cabo PM Carlos Alberto de Almeida Rocha, autor dos disparos que mataram o estudante, nunca cumpriu pena pelo crime. O taxista Florisvaldo Oliveira de Freitas, acusado como autor intelectual do homicídio, também nunca pagou. O mesmo aconteceu com os soldados Carlos Moreira dos Santos, Hamilton Silva Ribeiro e José Roberto Machado Ferreira.

Os cinco chegaram a ser condenados quando foram levados a júri popular em 2005, nove anos depois do assassinato de Guto. À época, o processo foi desmembrado, e os cinco foram julgados em três processos distintos.

Florisvaldo foi condenado a 17 anos de prisão, o ex-cabo Almeida Rocha a 16 anos de reclusão e os três soldados foram apenados a 12 anos. Mas o advogado Tílson Santana, defensor do taxista, recorreu da decisão à segunda instância, alegando que, no julgamento, foram usados jurados que também tinham participado do tribunal que condenou o cabo.

Houve a participação de um mesmo jurado, o que seria vedado legalmente. Os três magistrados da 2ª Câmara Criminal acataram o argumento da apelação unanimemente e concederam a anulação dos três julgamentos.

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Juiz admite que errou e anuncia novo julgamento

Coma anulaçãodojulgamento dos assassinos do estudante Augusto César Soares Dourado, outro júri popular foi marcadoparaodia16deagosto deste ano.Os três soldados, o ex-cabo e o taxista vão ser levados novamente a juízona 2ª Vara do Júri, no Fórum Ruy Barbosa.

Desta feita, os cinco acusados vão passar por apenas um julgamento, ao contrário do que ocorreu em 2005, quando o processo do caso Guto foi desmembrado em três júris. Atualmente, não é permitido fazer o desmembramento de julgamentos, como era legal à época.

A anulação dos três julgamentos de 2005 ocorreu porque jurados que atuaram nos júris dos soldados e do cabo foram convocados para o julgamento do taxista.

O advogado criminalista Tílson Santana, defensor do taxista, entrou com um recurso em 2006 noTribunalde Justiça, argumentando a irregularidade.

"Eu fiz constar na ata do júri de 2005 que a repetição de jurados era proibida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Mas o juiz e o promotordiscordaram", contou Santana. Ele explicou ainda que a repetição de um jurado pode interferir no julgamentodele:" O jurado pode ir para o segundo julgamento com uma predisposição de condenar, influenciado pelo primeiro".

O juiz Vilebaldo Freitas, titular da 2ª Vara do Júri, que conduziu os julgamentos em 2005, reconheceu que o erro aconteceu. Mas os magistrado ressaltou que os acusados vão responder pelo crime, sendosubmetidosanovojúri popular."Quem nunca errou, pelo amor de Deus? Tava todo mundo no julgamento, eu, o promotor, mas ninguém percebeu", comentou. O promotor público Davi Galo, acusador no julgamento, disse apenas que discorda da decisão de anular os julgamentos de 2005.

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Mãe do rapaz assassinado descreve frieza dos matadores

"Meu filho não volta mais, mas quero ver os assassinos presos para que outras mães não passem pelo o que eu passei", desabafou a professora Maria da Glória Soares Dourado, 62 anos, mãe do estudante Augusto César Soares Dourado, 18. Inconformada com a falta de punição para os assassinos de Guto, mãe do rapaz pede justiça.

Indignada com a anulação do julgamento dos cinco acusados do assassinato do filho, a pedagoga disse que a morte abalou toda sua família e que agora eles vão ter que reviver o mesmo pesadelo. "Enquanto a sociedade se calar, inocentes vão continuar sendo assassinados.

Nossa vida foi destruída, a gente vive porque não pode morrer", desabafou.

A professora questionou o valor da vida humana, em função do motivo banal que motivou o assassinato do Augusto César. "Por causa de uma batida que nem amassou o carro do taxista, eles matarammeu filho. Que sociedade é essa", indagou. Ela contou também como foram os últimos minutos de vida do filho e como ele foi morto friamente.

Maria da Glória contou que, após Augusto César colidir o carro com o táxi de Florisvaldo, em Brotas, foi perseguido por vários taxistas. Quando avistou uma viatura, no Jardim de Alah, parou achando que tinha se salvado. Segundo ela, os policiais já chegaram atirando. Apesar do carro do estudante ter sido atingido por mais de 15 tiros, ele não tinha sido baleado.

A versão da acusação sustenta que o ex-cabo Carlos Alberto de Almeida Rocha se aproximou do carro do rapaz e perguntou: "É esse?" Com a confirmação dos taxistas, o policial militar executou Guto com vários tiros. O amigo da vítima, Valter Filho, que estava no banco do carona, gritava desesperadamente: "Nós não somos ladrões, ele (Augusto César) é filho do prefeito de Barro Alto.

O ex-cabo foi expulso da polícia em 1997. Carlos Alberto respondia a outros crimes e foi flagrado em escuta telefônica contratando outro PM para manda matar o promotor Davi Galo. Os três soldados que também atiraram contra o carro também foram expulsos da PM, mas conseguiram ser reintegrados à corporação por força de mandado judicial.